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Uma Palestina  sem Hamas – A condição europeia para apoiar dois Estados

25 de setembro de 2025, às 02h50

O presidente do Estado da Palestina, Mahmoud Abbas, discursa durante a Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) na sede das Nações Unidas em 21 de setembro de 2023 na cidade de Nova York [Michael M. Santiago/Getty Images]

Após quase 70 mil mortes em dois anos, diversos esforços europeus vêm sendo feitos pelo reconhecimento do Estado Palestino para facilitar uma solução política do que chamam de conflito, embora ainda não haja uma proposta que leve em conta a conjuntura política local de Gaza. Para expressar um apoio mais abrangente do bloco europeu, ainda falta o aceno de um grande aliado de Israel e importante parceiro comercial dos EUA: a Alemanha. E é preciso considerar a resistência da Itália, cujo governo de extrema direita prefere ignorar a pressão popular pró-Palestina.

Portugal, Reino Unido, Canadá, Austrália reconheceram o Estado Palestino, dia 21 de setembro, sob condições políticas. Na segunda-feira (22), primeiro dia da 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), em Nova Iorque, o presidente Emmanuel Macron, anunciou oficialmente a mesma decisão. “Chegou a hora de fazer justiça ao povo palestino”, declarou sob aplausos e ovações de pé por parte de alguns dos presentes na sala. A ausência de representantes dos EUA e de Israel foi sentida. O anúncio de Macron foi seguido por Luxemburgo, Bélgica e Malta. Possivelmente, Nova Zelândia e Liechtenstein adotem a mesma posição, facilitando trocas diplomáticas com a Autoridade Palestina.

Uma das condições impostas pelos aliados históricos de Israel, é levar o Hamas ao ostracismo político na região, além de entregar o controle de Gaza à Autoridade Palestina, que vem alinhando seus interesses aos dos israelenses.

A declaração não foi conjunta, mas coordenada entre si, e não deixa de ser um movimento importante dentro do G7, grupo dos países economicamente mais ricos. Na manhã de segunda-feira (22) a bandeira da Palestina foi hasteada sob aplausos em frente a antiga Missão Palestina que se tornou a embaixada palestina de Londres, em uma cerimônia emocionante, com a presença do embaixador nomeado, Husam Zomlot.

Os governos pediram  a libertação de todos os reféns israelenses, realização de reforma institucional, preparação de eleições, reconhecimento pleno de Israel por parte dos grupos árabes-palestinos. Além disso, condenaram o “terrorismo”, numa clara referência aos ataques de 7 de outubro de 2023.

O reconhecimento, porém, não significa a tomada de ações concretas na ONU para barrar o genocídio, dada a posição dos EUA no Conselho de Segurança . Donald Trump continua seguindo a cartilha imperialista estadunidense, vetando o projeto de cessar fogo imediato no conselho. O mais recente ocorreu quinta-feira (18/9) com o placar de 14X1.

Na semana passada, em visita de Trump ao Reino Unido para acordos comerciais e tecnológicos, o  primeiro-ministro Keir Starmer chegou a afirmar que ambos “concordam plenamente” sobre a necessidade de um roteiro para a paz entre Israel e Palestina. Donald Trump, porém, disse discordar dos países que reconhecem a Palestina como um Estado.

Com isso, os apelos da ONU acabam evocando e ficando na dependência de deciões bilaterais. Em 2024, Espanha, Noruega e irlanda já haviam anunciado o reconhecimento do Estado Palestino e ações ao seu alcance. O governo de Pedro Sánchez, que se tornou uma voz crítica a Israel, anunciou no início de setembro, nove medidas práticas para combater o transporte de armas e combustíveis para o Exército de Israel. Na ONU, disse esperar ver o primeiro-ministro de Israel, Netanyahu, levado ao Tribunal Penal Internacional.

O posicionamento a favor da soberania palestina foi reiterado pelo presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, durante seu discurso de abertura da Assembleia da ONU. Ele lembrou o veto estadunidense no Conselho de Segurança e disse que o conflito é o símbolo maior dos obstáculos enfrentados pelo multilateralismo mostrando “como a tirania do veto sabota a própria razão de ser da ONU, de evitar que atrocidades como as que motivaram sua fundação se repitam”.

“Diante da omissão do Conselho de Segurança, a Assembleia Geral precisa exercer sua responsabilidade. Apoiamos a criação de um órgão inspirado no Comitê Especial contra o Apartheid, que teve papel central no fim do regime de segregação racial sul-africano. Assegurar o direito de autodeterminação da Palestina é um ato de justiça e um passo essencial para restituir a força do multilateralismo e recobrar nosso sentido coletivo de humanidade”, propôs Lula.

Recentemente, a Itália proibiu a entrada de dois caminhões que supostamente abasteceriam embarcações no Porto de Ravenna, no Mar Adriático, com armas para território israelense. Trabalhadores portuários da França, Suécia e Grécia têm feito o mesmo. 

Benjamin Netanyahu vem acusando nações europeias de traição e de  serem cúmplices do Hamas.


Protestos



Atendendo a uma convocação de greve geral de 24 horas, de organizações sindicais, mais de 100 mil italianos tomaram às ruas em pelo menos 75 cidades para pressionar o governo a se somar ao grupo dos países europeus que estão reconhecendo o estado palestino. Diversas escolas não funcionaram, os fluxos de trens, portos e estradas foram interrompidos, consolidando como um dos maiores protestos nacionais da Europa contra a ofensiva de Israel em Gaza. 

Em Milão, onde cerca de 50 mil pessoas se reuniram, segundo organizadores, manifestantes vestidos de preto e armados com bastões tentaram destruir a entrada principal da estação ferroviária central. Ao tentar impedir, a polícia, que foi recebida com bombas caseiras, garrafas e pedras, revidou com spray de pimenta. Mais de 10 pessoas foram detidas e em torno de 60 policiais sofreram ferimentos graves.

 A polícia de Bolonha também reagiu de forma violenta utilizando canhões de água para dispersar uma multidão que bloqueava uma estrada principal. Em Roma, mais de 20.000 pessoas reuniram-se em frente à estação ferroviária Termini.

Já a mobilização em Portugal ficou por conta da sociedade civil que realizou no final de semana passado diversos atos em todo o país em solidariedade à Flotilha da Liberdade. Foi a primeira ação coordenada no país para ocorrer manifestações simultaneamente.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.