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Comissão Europeia sugere congelar comércio com Israel, que ameaça retaliação

21 de setembro de 2025, às 09h24

Presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, em Bruxelas, na Bélgica, em 16 de setembro de 2025 [Dursun Aydemir/Agência Anadolu]

A Comissão Europeia — principal órgão executivo da União Europeia — sugeriu congelar o acordo de livre comércio, estimado em €68 bilhões (US$72.5 bilhões), com Israel devido à escalada na Faixa de Gaza.

A medida sucede protestos crescentes pelo fim da cumplicidade com o genocídio, assim reconhecido pela Comissão Independente Internacional de Inquérito das Nações Unidas nesta semana, após dois anos de análise extensa.

Para Hadja Lahbib, comissária europeia para assuntos humanitários e gestão de crise, os Estados-membros têm responsabilidade de agir frente ao dossiê, sobretudo pela falta de melhora em Gaza.

Neste sentido, a Comissão Europeia revelou planos para reduzir relações comerciais com Israel e sancionar ministros, em aparente inflexão na postura do bloco. A proposta, caso adotada, constituirá um golpe ao Acordo de Associação firmado em 2000.

A medida deve abranger a retomada de tarifas de aproximadamente €5.8 bilhões (US$6.2 bilhões) a exportações israelenses, além de fim da preferência comercial e dos benefícios mútuos em áreas como licitações públicas e propriedade intelectual.

Maros Sefcovic, comissário de comércio, acrescentou: “Lamentamos ter de assumir este passo. Contudo, cremos que é tanto apropriado quanto proporcional, dada a crise que se desenrola em Gaza”.

Para além das ações fiscais, a comissão propôs sanções aos ministros israelenses Itamar Ben-Gvir (Segurança Nacional) e Bezalel Smotrich (Finanças), responsáveis por políticas de limpeza étnica.

Conforme Ursula von der Leyen, presidente, “os eventos horríveis em Gaza, quase diários, têm de parar … É preciso um cessar-fogo imediato, acesso humanitário irrestrito e soltura de todos os reféns mantidos pelo Hamas”.

Israel, de sua parte, retrucou com ameaças, ao alegar “distorção moral e política”. Gideon Saar, ministro de Relações Exteriores, insistiu: “Ações contra Israel ferem os interesses da própria Europa”.

“Israel seguirá lutando, com a ajuda de nossos amigos na Europa”, afirmou. “Ações contra nós terão resposta na mesma moeda — esperamos que não seja necessário”.

As medidas, porém, enfrentam obstáculos de tramitação. Decisões comerciais requerem “maioria dupla”, de 15 dos 25 países-membros, com representação de ao menos 65% da população do continente.

Alemanha e Itália não indicaram apoio — tampouco obstrução. Um porta-voz afirmou que Berlim “não formou, até então, uma opinião final”.

Sanções individuais vão além, com apoio unânime, com provável bloqueio da República Tcheca e da Hungria do extremista de direita Viktor Orban.

Kaja Kallas, chefe de política externa do bloco, reconheceu divisões, mas instou membros hesitantes a se engajar no debate: “Se não apoiam essas medidas, então o que sugerem? Tragam alternativas”.

A União Europeia é o maior parceiro comercial de Israel, com 32% de seu comércio. Em 2024, trocas bateram recorde de €42.6 bilhões (US$45.4 bilhões), dos quais €15.9 bilhões (US$16.9 bilhões; 37%) se beneficiaram de tratamento preferencial.

A comissão indica agir após meses e meses de pressão da sociedade civil, organizações de direitos humanos e mesmo importantes membros do bloco.

A Espanha anunciou medidas próprias, incluindo embargo de armas e boicote a eventos culturais e esportivos que contem com a participação de Israel.

O exército israelense mantém ataques indiscriminados a Gaza desde outubro de 2023, com ao menos 65 mil mortos, 165 mil feridos e dois milhões de desabrigados, sob cerco, destruição e fome. Dentre as mortes, ao menos dezoito mil são crianças.

Em novembro, o Tribunal Penal Internacional (TPI), com sede em Haia, emitiu mandados de prisão contra o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, e seu ex-ministro da Defesa, Yoav Gallant, por crimes de guerra e lesa-humanidade em Gaza.

Israel é ainda réu por genocídio no Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), também em Haia, sob denúncia sul-africana deferida em janeiro de 2024.

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