O chef José Andrés, fundador da ong World Central Kitchen (WCK), tornou-se alvo de críticas online após se encontrar com o presidente de Israel, Isaac Herzog, para discutir o bloqueio absoluto imposto a Gaza há mais de sete meses.
Andrés visitou Gaza pela primeira vez desde que eclodiu o genocídio, ao compartilhar imagens e vídeos da destruição em curso, bem como do trabalho de sua instituição. Após deixar o enclave, confirmou se reunir com Herzog no domingo (17), para tratar do cerco, descrito pela Anistia Internacional como campanha de fome deliberada.
“Falamos em detalhes sobre como encher Gaza de comida e medicamentos, para que não haja fome ou saque, para que possamos dar início à reconstrução, com humanidade e esperança”, escreveu Andrés na rede social X (Twitter). “Isso significa pleno acesso de todas as ongs que possam ajudar a rematar o desespero e o sofrimento do povo palestino”.
“Eles estão dispostos a ajudar com tudo que podem, com a soltura dos reféns, fim da guerra e envio de toda ajuda humanitária necessária”, acrescentou.
Herzog, de sua parte, saudou a ong e reproduziu as imagens de Andrés, em postagem online, ao deflagrar críticas de toda parte. Para muitos, o esforço de Andrés é deplorável, equivalente a avalizar as violações israelenses, incluindo o assassinato de sete voluntários internacionais da WCK, em abril de 2024. Em novembro, outros três foram mortos, por um novo bombardeio.
A rede Middle East Eye contactou a WCK para tratar das críticas, mas não recebeu resposta até a publicação.
“[Andrés] aceitou uma medalha do homem que forneceu as bombas para assassinar seus voluntários”, recordou um usuário online, sobre evento na Casa Branca no início do ano, quando o então presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, concedeu a Medalha da Liberdade ao chef espanhol. “Agora, aperta as mãos daquele que encomendou suas mortes”.
Israel murdered 7 of his employees and now he’s doing photo ops with them. @chefjoseandres disgraceful. https://t.co/4MIbXQAeng pic.twitter.com/TgioX7O5Hg
— B L A K E L E Y™℠©® LLC (@_iamblakeley) August 18, 2025
“As pessoas que cumprimenta tem o sangue de dezenas de milhares de palestinos nas mãos — palestinos que você diz tentar ajudar”, escreveu a jornalista Leyla Hamed. “Não nos esqueçamos: mataram também sete membros de sua ong. Ainda assim, aperta suas mãos. Vergonhoso @chefjoseandres”.
Bem maior?
Houve quem reagisse às críticas ao alegar que os encontros seriam parte da missão de Andrés, necessários, de algum modo, para ajudar a conter o desastre humanitário que Israel impôs a Gaza.
“Odeio que Herzog tenha um ensaio de fotos com ele — ao menos não é [Netanyahu] —, odeio que isso possa ser visto como um desrespeito aos membros da WCK assassinados [por Israel], mas se isso levar comida às pessoas de Gaza, consigo entender seu sacrifício”, argumentou um usuário no Reddit. “Ele fez muito mais ao povo palestino, e às pessoas que sofrem no mundo, do que jamais fiz, e eu não pretendo julgá-lo por conta disso”.
Outro usuário respondeu, ao notar que, após dois anos de genocídio israelense em Gaza, é natural que as pessoas sejam céticas frente a organizações que líderes ocupantes apoiem publicamente.
“Se isso de fato resultar em mais comida entrando em Gaza, sem condições, está bem. Estou disposto a viver com isso mesmo que ache justo denunciar sua hipocrisia”, ressaltou a postagem. “Contudo, também vimos o que acontece quando Israel coordena esforços assistenciais, desde a Fundação Humanitária de Gaza [GHF] aos lançamentos aéreos, com mais e mais mortes. Penso que é justo ser cético sobre um oficial israelense subitamente dando aval à ajuda humanitário, visto como transformaram isso em arma de guerra nos últimos quatro meses”.
Escrutínio sobre relações com Israel, que chegou a enaltecer a ong, se aprofundaram desde janeiro, quando autoridades coloniais proibiram a Agência das Nações Unidas para Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA) de operar nos territórios ocupados.
“Ninguém além da WCK tem recebido permissão para transportar assistência por vias marítimas, enquanto grupos civis eram atacados e massacrados por Israel ao tentarem fazê-lo”, notou Ali Abunimah, jornalista palestino da rede Electronic Intifada, no último ano. “Este ‘empreendimento’, ou ‘plano-piloto’ apenas faz sentido em um contexto onde a UNRWA é eliminada”.
O tratamento inconsistente de Israel sobre a ong, comparado a outras, junto da saudação pública de Herzog a Andrés, incitou revés. A mensagem firme de palestinos e ativistas estrangeiros sobre o encontro é sobre temores de que Israel, junto dos Estados Unidos, estejam utilizando figuras e instituições influentes para lavar sua imagem e encobrir seus crimes.
“Israel assassinou trabalhadores de sua ong, mas o chef esquece: encobre os crimes e adota a ‘caridade dos sanduíches’ onde quer que lhe convenha”, insistiu uma postagem, dentre as mais indignadas. “Que essa foto o assombre para sempre, aonde quer que vá”.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.
![José Andrés, fundador da World Central Kitchen (WCK), encontra-se com o presidente de Israel, Isaac Herzog, em 17 de agosto de 2025 [Isaac Herzog/Divulgação/X]](https://www.monitordooriente.com/wp-content/uploads/2025/08/WCKAndresHerzogAug25.png-1200x675.webp)