Mulheres, linha vermelha: Ataques de Teerã em Baluchistão causam indignação

Samand Muhammad-Shahi
4 meses ago

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Protesto de mulheres baloches na província de Khash, em 4 de julho de 2025 [@haalvsh/X]

O povo baloche no Irã vive hoje profunda indignação e marginalização devido a políticas discriminatórias e opressivas do regime xiita de hegemonia persa. A supressão de vozes e aspirações dos baloches, com perseguição de dissidentes e abusos de direitos, conferiu volume e impulso à insurgência na província de Sistão-Baluchistão, no sudeste do Irã.

Em 1º de julho, o exército iraniano invadiu a aldeia de Gonich, no distrito de Kavandar, em Khash, e abriu fogo contra mulheres que protestavam contra sua conduta. Duas mulheres morreram e dez se feriram.

Os disparos de soldados a mulheres desarmadas, e as baixas subsequentes, enlutaram e indignaram pessoas de todo o Baluchistão. Após o massacre de Zahedan, ou Sexta-Feira Sangrenta, em 30 de setembro de 2022, a tragédia em Gonich outra vez uniu os baloches frente às atrocidades da teocracia. Em Zahedan, capital baloche, forças de segurança do Irã mataram mais de cem fiéis e manifestantes, incluindo 13 crianças, ao reprimir um ato contra o estupro de uma adolescente pelo chefe de polícia em Chabahar. Apesar de um longo ano de protestos de sexta-feira por justiça, o governo iraniano não cedeu em manter “sua cultura de impunidade às atrocidades do Estado”.

Segundo detalhes disponíveis do incidente em Gonich, durante a invasão à aldeia, tropas agrediram e feriram mulheres que objetaram a ação. Ao ouvir os gritos de uma concidadã, uma mulher baloche buscou reunir outras para protegê-la e resistir à agressão. Contudo, as forças militares não hesitaram em abrir fogo. Reyhaneh Bameri, então grávida, perdeu seu bebê — “chutada e atingida com balas de borracha por policiais”. Em 4 de julho, Khan Bibi Bameri, de 40 anos, faleceu de seus ferimentos no Hospital Khomeini de Khash.

Vídeos mostram mulheres baloches tentando resistir, ao atirar pedras. Após o massacre, mulheres protestaram, ao incendiar pneus e bloquear o acesso à aldeia.

Vídeo mostra mulheres baloches protestando contra opressão policial na aldeia de Gonich, em 1º de julho de 2025 [Screenshot/Reprodução/bramsh.org]

A versão oficial permanece evasiva. Sem detalhes, o Quartel-General Regional da Guarda Revolucionária insiste que, durante as ações em Khash, buscava prender espiões ligados a Israel, quando locais desacataram às instruções de segurança.

O Centro de Estudos e Direitos Baloches, radicado em Londres, condenou “o uso ilegal de força excessiva e letal por forças de segurança e militares iranianas contra mulheres civis na aldeia de Gonich”, ao sugerir que o regime “explora o cenário atual [pós-conflito com Israel] para intensificar sua repressão contra o povo baloche”.

Recentemente, um grupo de especialistas das Nações Unidas instou Teerã a não apelar a situações de crise como “oportunidade para ampliar a repressão”. O grupo apontou ainda apreensões sobre “relatos de incitação à discriminação, hostilidade e violência na mídia, ao rotular minorias inteiras como supostos traidores”.

Em um Estado em que a dissidência é crime, criticar o regime e suas forças de segurança demanda dupla coragem, sob altíssimo risco. Ainda assim, toda a sociedade baloche tem condenado firmemente o caso, ao reivindicar justiça. Em 4 de julho, protestos voltaram a ocorrer em frente à sede do governo em Khash, por ação contra os perpetradores dos atos em Gonich.

Anciões baloches se lançaram na vanguarda, ao ecoarem os sentimentos do povo. Sardar Yosef Naroei, por exemplo, reiterou: “O povo baloche é um povo nobre, mas sua paciência tem fim. A indignação não se extinguirá por meio das balas. Nossas mulheres são a nossa linha vermelha”. Ali Raza Shahbakhsh ecoou o sentimento: “Mulheres são sagradas. Toda e qualquer violação a elas é inaceitável e não permitiremos que continuem tais ações de violência”. Sardar Amanullah Brahui, por sua vez, caracterizou os disparos como “crimes que não podemos perdoar, tampouco esquecer”, ao advertir “não se pode esperar que a nação baloche fique agora em silêncio, diante de crimes tamanhos”.

Mais de 50 tribos e clãs emitiram denúncias à parte, com apelos por justiça.

Ainda em 4 de julho, Maulana Abdolhamid, principal líder sunita do Irã, confirmou em seu sermão de sexta-feira ter requerido do Conselho de Segurança da Província um inquérito sobre o incidente em Gonish, para punir legalmente os responsáveis. Segundo seu relato, “autoridade provinciais prometeram tratar da matéria com justiça e punir infratores — não importa quem sejam”.

O grupo insurgente baloche Jaish Al-Adl, sunita, descreveu o caso de Gonich como “crime hediondo”, ao lamentar que “mães e irmãs não mais estejam entre os seus”, e alertar que “tamanha crueldade certamente terá resposta”.

Após o incidente, um surto de operações militantes agravou o tumulto sociopolítico que tomou o Baluchistão. Segundo relatos, um ataque a uma base militar próxima a Zahedan matou sete soldados, em 8 de julho. Uma operação de segurança em Chabahar resultou, por sua vez, em seis militantes mortos ou presos, logo no dia seguinte. Na mesma cidade, em 11 de julho, nova ação de resistência matou três soldados e um militante. No dia 26 de julho, o Jaish al-Adl alvejou o Departamento de Justiça da Província, com confrontos e ao menos nove mortos, incluindo quatro soldados, três militantes e dois civis. Outro ataque em Zahedan matou um comandante paramilitar Basij, em 27 de julho.

A paisagem socioeconômica do Baluchistão se caracteriza, ainda hoje, pelo menor índice de desenvolvimento humano e as maiores taxas de pobreza, desemprego e analfabetismo no Irã. Com 5% da população do país, os baloches logram de números desproporcionais de execuções sumárias e assassinatos das forças de segurança. Segundo Relatório Anual de Direitos Humanos da Campanha de Ativismo Baloche, ao longo de 2024, ao menos 122 pessoas — oito mulheres — foram mortas e 114 feridas na província, devido a incursões, ataques e disparos indiscriminados das forças nacionais iranianas. Não-persa e não-xiita, o povo baloche enfrenta uma estrutura similar a apartheid, com contenções oficiosas a expressões de identidade, cultura, idioma e direitos políticos e religiosos.

Por quase meio século, os baloches enfrentam violência, exclusão e privação de direitos, bem como tentativas de assimilação compulsória por sucessivos governos em Teerã. No entanto, recusam-se a desistir de sua identidade, suas terras, sua cultura e seus direitos nacionais e cívicos, ao resistir à opressão com uma inquebrantável vontade de existência e de sobrevivência. Teerã é, sim, responsável por tragédias como na Sexta-Feira Sangrenta e a chacina de Gonich, a fim de subjugar os anseios baloches; porém, acaba por catalisar a união das comunidades oprimidas.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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