Campanha israelense nas redes sociais nega fome em Gaza, apesar das mortes

Middle East Eye
4 meses ago

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As contas oficiais de Israel, bem como usuários sionistas, deflagraram na última semana uma campanha nas redes sociais para negar a existência da fome em Gaza, enquanto palestinos documentam sua própria morte por inanição, sob cerco militar.

A página oficial do Estado de Israel na rede social X (Twitter) compartilhou diversas postagens sugerindo que as imagens de crianças famintas e desnutridas mostradas ao mundo seriam fabricadas, ao alegar outras doenças, como “fibrose cística”.

Nas últimas semanas, múltiplas organizações internacionais, assim como o Ministério da Saúde palestino, advertiram para a catástrofe de fome em Gaza. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), toda a população do território palestino — mais de 2.4 milhões de pessoas — enfrenta insegurança alimentar grave.

Uma em cada três pessoas não come há dias, e 80% de todas as mortes por inanição são crianças”, ressaltou o alerta.

Enquanto o número de mortos em Gaza já ultrapassa 60 mil, ao menos 154 pessoas morreram devido à desnutrição.

Em maio, a Organização Mundial da Saúde (OMS) confirmou que toda a população de Gaza vive sob escassez prolongada de alimentos, com quase meio milhão de pessoas em situação catastrófica, sob desnutrição aguda, inanição, doenças e risco morte.

“Trata-se de uma das piores crises de fome do mundo, ocorrendo em tempo real”, acrescentou.

Mesmo o mais firme aliado de Israel, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reconheceu “fome real” na Faixa de Gaza sitiada.

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No entanto, apesar das evidências, a campanha israelense insiste em negar que a crise no enclave. As contas oficiais de Israel compartilharam postagens descrevendo a fome como uma “mentira que viralizou”, ao insistir que a “doença de uma criança” fora “distorcida como propaganda”.

Em outra postagem, Israel reproduziu um vídeo de Mohammad al-Hasanat, de 41 anos, que supostamente sofria de diabetes quando faleceu.

No entanto, diversos médicos que trabalharam em hospitais de Gaza reportaram incontáveis vezes como doenças pré-existentes se tornam extremamente difíceis de tratar precisamente pela desnutrição, bem como acesso a cuidados de saúde adequados — ambos gravemente limitados pelo cerco contínuo de Israel ao território.

A organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) registrou um aumento acentuado na desnutrição infantil em Gaza, com casos em crianças menores de cinco anos triplicando nas últimas semanas, em meio à crise humanitária.

Mesmo médicos relataram que estão ficando fracos demais sequer para cuidar dos doentes, devido à falta de alimentação adequada.

Quase uma dúzia de profissionais de saúde em toda a região contaram ao The Guardian e à Arabic Reporters for Investigative Journalism sobre suas crescentes dificuldades para encontrar comida, além de sua degradação física causada pela fome.

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O New York Times divulgou uma reportagem sobre uma criança em Gaza identificada como Muhammad Zakariya Ayyoub al-Matouq, diagnosticada com desnutrição grave. Diante da campanha israelense, divulgou uma errata: “Após a publicação, o Times soube que [Muhammad] também tinha problemas de saúde pré-existentes”, ao sugerir que a fome poderia não ser a causa de sua morte.

Muhammad Zakariya Ayyoub al-Matouq, um menino palestino de uma ano e meio sofre de desnutrição grave e corre risco de vida devido ao brutral bloqueio de Israel. Apesar das negações israelenses de que a criança sofre de fome, fontes médicas confirmaram que Muhammad sofre de desnutrição aguda. O estado debilitado da criança atraiu a atenção global, simbolizando a grave crise humanitária que afeta mais de 2 milhões de palestinos em meio ao bloqueio e aos ataques contínuos de Israel. [Anas Zeyad Fteha/Agência Anadolu]

Várias vozes pró-Israel se aproveitaram do recuo americano para disseminar que o caso de Muhammad comprovaria que a fome seria “uma mentira”, ao reforçar a campanha online.

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Todavia, em entrevista à rede britânica Middle East Eye, Yasin Fatine, pediatra radicado em Londres, confirmou que as fotos de Muhammad e de outras crianças são consistentes com inanição — e não com quaisquer deficiências de longo prazo.

Muhammad Zakariya Ayyoub al-Matouq, um menino palestino de uma ano e meio sofre de desnutrição grave e corre risco de vida devido ao brutral bloqueio de Israel. Apesar das negações israelenses de que a criança sofre de fome, fontes médicas confirmaram que Muhammad sofre de desnutrição aguda. O estado debilitado da criança atraiu a atenção global, simbolizando a grave crise humanitária que afeta mais de 2 milhões de palestinos em meio ao bloqueio e aos ataques contínuos de Israel. [Anas Zeyad Fteha/Agência Anadolu]

A alegação de que doenças pré-existentes dos palestinos — e não a fome — seriam a verdadeira causa de suas mortes também incitou controvérsia nas redes sociais. Muitos reiteraram que o contínuo bloqueio israelense ao acesso humanitário, incluindo alimentos, é o verdadeiro responsável pelas fatalidades.

Enquanto isso, palestinos continuam compartilhando provas abundantes de pessoas gravemente afetadas ou mortas por desnutrição.

Organizações internacionais, incluindo a maior entidade judaica no Reino Unido, denunciam o uso da fome como arma de guerra por Israel em Gaza, ao reivindicar “um fluxo massivo e sustentado de assistência”.

Ammar Ammar, do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), observou ao Middle East Eye:

“A desnutrição debilita rapidamente o sistema imunológico, ao tornar doenças comuns, como diarreia e pneumonia, muito mais letais”.

Embora todas as opiniões especializadas indiquem que, mesmo que haja doenças pré-existentes que tenham porventura contribuído para as mortes, a campanha negacionista de Israel permanece desconectada não apenas com a realidade, como com o ponto de vista expressado por cada vez mais usuários nas redes sociais.

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Artigo publicado originalmente em inglês pela rede Middle East Eye, em 30 de julho de 2025

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