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O que falta a Israel é uma chuva da maior Jihad do imã Khomeini

Protesto na Praça Palestina em Teerã em apoio ao ataque a drones da República Islâmica contra Israel, em 15 de abril de 2024 [Fatemeh Bahram/Agência Anadolu]

Desde o contra-ataque que o Irã lançou contra Israel, muitos termos têm ressurgido no vocabulário popular ocidental, especialmente um dos mais temidos e malcompreendidos: a Jihad. Mas o que exatamente é uma Jihad? Contra quem essa “guerra santa” é travada? Estaremos nós, ocidentais, entre os próximos alvos do Irã? Para entender o que é a Jihad, seu significado e seu principal alvo, podemos recorrer aos ensinamentos do aiatolá Khomeini. Até hoje, os ensinamentos desse líder espiritual, revolucionário e fundador da República Islâmica do Irã, continuam a ser uma fonte de conhecimento sobre a jurisprudência islâmica e seus códigos éticos e morais.

Ruhollah Khomeini foi um líder religioso e político iraniano, famoso por seu papel influente na Revolução Islâmica de 1979, que resultou na queda do regime do xá Mohammad Reza Pahlavi e na instauração da República Islâmica do Irã. Nascido em uma família tradicionalmente religiosa, desde cedo, Khomeini dedicou-se ao estudo do Islã e da teologia, tornando-se um clérigo respeitado e influente. Em 1964, Khomeini foi forçado ao exílio na cidade de Najaf al-Ashraf, no Iraque, onde proferiu uma série de palestras a seminaristas no Centro Teológico Islâmico, abordando o tema da “Maior Jihad”, da qual faço uso de sua transcrição para este artigo.

Discurso de Rohullah Khomeini em 3 de junho de 1963 – Escola Feyziyeh, Qom [emam/wikimedia]

O termo Jihad foi popularizado no Ocidente como a “guerra” dos muçulmanos contra os não-muçulmanos — ou “infiéis”. Parte dessa popularização se deve a grupos fundamentalistas que distorceram os ensinamentos do Islã para justificar motivações terroristas. É importante notar que “terrorismo” e “fundamentalismo” são termos complexos que merecem análise mais aprofundada em outra ocasião. Por hora, vamos nos concentrar em Jihad.

Após os eventos de 11 de setembro de 2001, líderes ocidentais contribuíram para estigmatizar os muçulmanos, rotulando-os de forma generalizada como fundamentalistas. Claro, a realidade é bem diferente. Assim como no judaísmo e no cristianismo, o Islã possui diversas correntes de interpretação da jurisprudência religiosa, e essas correntes nem sempre estão alinhadas entre si. O centro desta discussão está em compreender o verdadeiro significado de Jihad conforme entendido pelos líderes iranianos, sendo as palavras do imã Khomeini em Najaf a base para suas ações militares.

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Khomeini compreendeu e transmitiu aos seminaristas que muitos líderes espirituais, independentemente da religião, deturparam a fé e a religião em benefício de seus próprios interesses. Isso nos leva a entender que a religião islâmica não pode ser estereotipada como única, com intenções e motivações que representem todas as nações nem todos os fiéis. Líderes políticos, especialmente os estadunidenses e israelenses, têm plena compreensão desse fato, ao rotular o Irã como um país naturalmente “fundamentalista” e “terrorista”, enquanto evitam críticas semelhantes a regimes totalitários do Oriente Médio dos quais compram petróleo.

Retornando ao conceito de Jihad, que é frequentemente traduzido como “guerra santa”, é importante notar que esse termo nem sequer é mencionado no Alcorão. Jihad significa simplesmente “lutar”, o que não necessariamente quer dizer empunhar armas, muito menos realizar ataques suicidas. De acordo com o Alcorão:

Os fiéis, que, sem razão fundada, permanecem em suas casas, jamais se equiparam àqueles que sacrificam seus bens e suas vidas pela causa de Deus; Ele concede maior dignidade àqueles que sacrificam seus bens e suas vidas do que aos que permanecem (em suas casas).

Surah An-Nisa – 95

Neste ponto, fica claro que a “luta” e o “sacrifício” mencionados pela escritura têm um caráter espiritual, não material. Existem muitas interpretações usadas por estudiosos para definir a Jihad, mas podemos resumi-las em duas generalizações: menor e maior.

Na menor Jihad, o conceito é lutar contra o agressor, o opressor, o colonizador. É uma missão divina para todo muçulmano combater as injustiças, como quando um grupo de ocidentais armados coloniza, assassina, estupra, prende, tortura ou até mesmo explode um consulado no Oriente, enquanto rotulam suas vítimas como “terroristas”. Segundo a menor Jihad, a dignidade muçulmana reside em lutar contra esses opressores. Mesmo considerando as expressões “luta” e “guerra”, há uma enorme diferença nos métodos utilizados pelos orientais e ocidentais, que abordaremos mais adiante. O imã Khomeini explicou isso aos seminaristas de Najaf com particular maestria:

Aqueles que hoje incendiaram uma parte do mundo, que derramam sangue e matam, fazem-no porque estão a competir entre si na pilhagem das nações do mundo e na absorção da sua riqueza e dos produtos do seu trabalho, e na destruição dos países fracos e subdesenvolvidos sob seu domínio e controle. Assim, em nome da liberdade, do desenvolvimento e da prosperidade, da defesa da independência e da proteção das fronteiras, e sob outros slogans enganadores, todos os dias as chamas da guerra são acesas em algum canto do mundo, e milhões de toneladas de bombas incendiárias são lançadas sobre nações indefesas. Esta luta pode até parecer correta e está de acordo com a lógica de pessoas mundanas cujos cérebros estão poluídos.

Como explicou Khomeini, é dever do muçulmano “lutar” por tais motivos. Está registrado, segundo a autoridade de Abu Huraira, que declarou o Profeta Mohammad: “Aquele que morreu, mas não lutou no caminho de Allah, nem expressou alguma determinação por lutar, morreu como morrem os hipócritas” (Sahih Muslim 2:4696).

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Mesmo essa luta contra os hipócritas e as injustiças não se compara à “maior jihad”, que é muito mais poderosa e eficaz. O conceito de maior Jihad refere-se à luta interna dos fiéis consigo mesmos, um aprimoramento ético, espiritual e de todas as outras virtudes, como caridade, compaixão, amor, justiça, verdade, respeito e honra.

Foi justamente sobre essa Jihad que o imã Khomeini discursou durante sua estadia no Iraque, bem como posteriormente, como mentor da Revolução Islâmica e até o final de sua vida, como líder supremo da República Islâmica do Irã. Esses ensinamentos hoje são seguidos como pilares no Irã, tanto em sua religião quanto em seu governo.

São os conceitos da maior jihad que levaram o Irã a direcionar seus drones e mísseis para bases militares em vez de áreas densamente povoadas de civis, como faz o Estado de Israel. Foi por meio dos ensinamentos de Khomeini que o Irã visou causar danos em unidades militares, evitando a perda de vidas inocentes.

O Estado sionista há muito tempo trata o Irã como “inimigo” e “terrorista”, admitindo a diferença entre os métodos da Guarda Revolucionária e das forças da ocupação israelense. Enquanto o Irã mira alvos militares e busca causar danos financeiros, Israel demonstra pouco apreço pela vida, inclusive de seus próprios combatentes, e teme o impacto financeiro que o Irã possa causar em sua instituição.

Foto: Uma criança palestina foge com seu pai depois que a família foi morta por um míssil israelense que atingiu sua casa, em Gaza, em 18 de janeiro de 2024 [Mohammed Asad]

Foto: Uma criança palestina foge com seu pai depois que a família foi morta por um míssil israelense que atingiu sua casa, em Gaza, em 18 de janeiro de 2024 [Mohammed Asad]

Khomeini, visto como oponente do imperialismo e do colonialismo ocidental, deixou um legado que transcende as barreiras da religião. Se os europeus sionistas que colonizaram a Palestina tivessem compreendido os conceitos do imã, talvez não estariam cometendo atrocidades contra mulheres, crianças, jornalistas, socorristas e outros civis. Talvez o que falte para Israel e seus líderes sionistas seja ética e moral, talvez, o que lhes falte seja uma chuva da maior Jihad ensinada por Khomeini.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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