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Repudiar a feira da morte é lutar contra genocídio

Protesto pró-Palestina pede embargo militar a Israel [Gabriel Matias/Reprodução]

Na próxima semana, entre 2 e 4 de abril, o Brasil abre mais uma vez suas portas para receber 50 delegações de 35 países na 5ª. edição da LAAD Security & Defense, a ser sediada no Expo Transamérica, em São Paulo. Entre os participantes, o Estado racista e colonial de Israel e suas empresas implicadas diretamente no genocídio em Gaza e na limpeza étnica avançada na Cisjordânia.

Um dos principais eventos internacionais do setor, assim como sua feira homônima que acontece nos anos ímpares no Rio de Janeiro, não à toa é apelidado pelos movimentos da sociedade civil organizada e defensores de direitos humanos de “feira da morte”. É lá que estados, autoridades e suas forças militares negociam as armas, equipamentos e tecnologias que derramam o sangue de negros, pobres e indígenas no Brasil e do povo palestino na contínua Nakba – a catástrofe cuja pedra fundamental é a formação do Estado racista e colonial de Israel em 15 de maio de 1948.

À abertura na manhã do dia 2, entre as autoridades, uma das presenças confirmadas, inclusive, é o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que está promovendo uma carnificina na Baixada Santista, a qual já deixou mais de 50 mortos desde dezembro de 2023. E as armas que promovem o genocídio pobre e negro aqui, como se vê neste momento, são as mesmas que seguem a matar palestinos. Tarcísio acaba de voltar de viagem para apertar as mãos do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. O aperto de mãos manchadas de sangue.

Em meio a um genocídio em curso na estreita Faixa de Gaza há quase seis meses, a “feira da morte”, que já é motivo de repúdio desde sempre, se torna um verdadeiro acinte. Sediá-la no Brasil, com o apoio de agências governamentais, ministérios da Defesa e da Justiça, e fechar negócios às custas de milhares de vidas – a maioria crianças e mulheres – vai na contramão do reconhecimento expresso pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, do genocídio cometido em Gaza. É o oposto do compromisso do Brasil, enquanto país signatário, com a Convenção de Prevenção e Repressão ao Crime de Genocídio.

LEIA: Cúmplice de genocídio: de onde Israel obtém suas armas?

As empresas israelenses são habitués nas diversas edições da LAAD, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Em seus estandes são apresentadas tecnologias “testadas em campo” – leia-se sobre as “cobaias humanas” que Israel converte os palestinos há mais de 75 anos para depois vender ao mundo suas armas da morte. É o que se vê inclusive neste momento, na Faixa de Gaza. São bombas que disparam lâminas e despedaçam os corpos atingidos ou promovem queimaduras jamais vistas, fuzis de longa distância, blindados, drones.

Todos a serviço do genocídio. Setenta por cento dessa produção destina-se à exportação, e o Brasil infelizmente não só continua a importá-las e, através do apoio do Ministério da Defesa, a saudar sua presença na “feira da morte”, como tem renovado contratos e mesmo fechado novas aquisições.

A Força Aérea Brasileira (FAB) anunciou em 5 de março um contrato com dispensa de licitação com a Israel Aerospace Industries (IAI) para manutenção e fornecimento de peças de dois drones Heron fabricados pela IAI e adquiridos pelo Brasil em 2009 para vigilância de fronteira, durante o segundo governo Lula. O contrato pode chegar a R$86 milhões em cinco anos.

Sobre o contrato FAB-IAI, como observa manifesto por iniciativa do movimento BDS Brasil – boicote, desinvestimento e sanções –, com a adesão de dezenas de comitês, organizações árabes-palestinas e brasileiras,  “os VANT Heron são desenvolvidos por Israel em particular para ter uma grande carga útil – até 490kg –, foram usados em todos os ataques a Gaza e estão sendo usados no atual genocídio no qual Israel já destruiu 75% da infraestrutura de Gaza e matou mais de 31 mil pessoas”.

Uma criança palestina, Musab al-Hams foi levada ao hospital com ferimentos graves na cabeça, rosto, mãos e pés, seu abrigo tornou-se alvo de mísseis israelenses. A criança  perdeu cinco de seus irmãos, enquanto três irmãos e sua mãe ficaram feridos no ataque aéreo lançado pelas forças israelenses no bairro de Sheikh Ridwan na Cidade de Gaza.  [Moussa Salem/Agência Anadolu]

Além disso, a Elbit Systems, maior empresa de tecnologia militar do Estado sionista, foi classificada como finalista em licitação para compra de 36 blindados de combate obuseiros num valor estimado em quase R$ 1 bilhão. Como destaca o manifesto chamado pelo BDS, o “Brasil também segue exportando petróleo para Israel, sendo uma das principais fontes e literalmente fornecendo combustível para os tanques e ataques genocidas”.

O documento segue:

“A contradição entre as falas do presidente e a política de exportação foi ressaltada por grandes veículos internacionais. A Colômbia, em 29 de fevereiro, suspendeu a compra de novos equipamentos e contratos com as empresas ligadas ao Estado de Israel e seu genocídio […]. Espelhar e cooperar com essa decisão, minimamente, é a única forma possível para que o Brasil possa cumprir de forma definitiva o direito internacional.”

O Brasil, após ofensas e humilhações de Israel, que declarou Lula persona non grata, chamou seu embaixador em Tel Aviv de volta para consultas. Não pode haver meias palavras diante de um genocídio, entretanto, também não pode haver meias ações.

Isso implica, como reivindica a Frente em Defesa do Povo Palestino de São Paulo em carta enviada a ministérios do governo, que o Brasil não apenas não endosse a realização da “feira da morte” e rejeite veementemente a presença de empresas sionistas implicadas no genocídio, mas rompa imediatamente todos os acordos e relações com o Estado racista e colonial de Israel.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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