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Execução de jovem na França indica racismo de Estado, alerta especialista

Memorial a Nahel M., jovem franco-argelino de 17 anos morto por policiais, em Nanterre, na França, em 3 de julho de 2023 [Firas Abdullah/Agência Anadolu]

O assassinato a tiros de Nahel M. jovem franco-argelino de apenas 17 anos, em um subúrbio de Paris, na última semana, não é novidade ou caso isolado, mas sim evidencia o racismo e a islamofobia institucionalizados na França, advertiu Salman Sayyid, cientista social britânico, especializado em temas do colonialismo.

“O Estado francês e segmentos da sociedade buscam uma orientação islamofóbica há anos”, afirmou Sayyid, professor da Universidade de Leeds, à agência Anadolu. “A morte de Nahel é um sinal do racismo e da islamofobia institucionalizados na polícia francesa, assim como no sistema de justiça penal e no próprio Estado”.

Protestos tomaram as ruas desde 27 de junho, quando um policial matou a tiros o rapaz de raízes argelinas e marroquinas, sob o pretexto de uma infração de trânsito. Vídeos, contudo, desmentiram a versão policial de que o jovem tentou atropelá-lo.

O agente foi então indiciado por homicídio doloso.

Centenas de manifestantes foram presos desde então, após as ações de desobediência civil se espalharem de Nanterre – periferia operária de Paris, onde Nahel foi assassinado – a todo o país, incluindo as cidades de Lyon, Toulouse, Lille e Marselha.

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O Estado francês é alvo de críticas por suas políticas de segurança doméstica, em particular, por discriminar minorias e imigrantes, que reportam violência excessiva e racismo endêmico por parte da polícia.

A Organização das Nações Unidas (ONU) instou o governo em Paris a abordar devidamente “questões de discriminação racial em seu sistema de aplicação da lei”.

Sayyid enfatizou que o comportamento da polícia francesa contra pessoas de determinadas origens étnicas ou identificadas como muçulmanas é estruturalmente racista.

“O governo não admite tais violações porque sequer reconhece a categoria de racismo”, acrescentou o pesquisador. “Este negacionismo é bastante comum em sistemas de opressão que carecem de capacidade de autorreflexão”.

Para o professor, o que acontece na França não representa riscos somente a muçulmanos e grupos marginalizados, mas a toda a sociedade. “A erosão dos direitos civis e democráticos afeta todos”, destacou Sayyid. “Combater a islamofobia é crucial para proteger os direitos de todos porque não há direitos civis sem direitos civis aos muçulmanos”.

Questionado sobre o surto de islamofobia na Europa, Sayyid alertou para a presença de uma corrente racista majoritária na União Europeia, ao descrever suas políticas e discursos como algo particularmente alarmante.

Sayyid citou a queima do Alcorão na Suécia, o banimento de grupos antirracistas na França e a perseguição a ativistas pró-Palestina na Alemanha.

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“Estes são países que supostamente valorizam e defendem os direitos humanos e civis tanto em escala global quanto em suas fronteiras”, apontou Sayyid. “Tais atos, no entanto, são um ataque a sua própria interpretação dos valores liberais. O espaço para o pensamento crítico e a divergência na União Europeia – suposto bastião liberal – está encolhendo”.

Para haver avanços, concluiu, é preciso unir forças não apenas entre muçulmanos, minorias e ativistas, como em toda a sociedade, ao aprimorar os pesos e contrapesos democráticos entre governantes e governados.

“A islamofobia e o racismo institucionais estão na vanguarda deste novo sistema que toma forma; portanto, para termos melhorias, é preciso enorme esforço [de] uma coalizão ampla e unida contra a xenofobia, pelos direitos dos ciganos, dos muçulmanos, dos africanos e de  todos os excluídos da sociedade”.

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