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Jornalismo é ‘crime’ no Egito: imprensa escrita e televisionada atrás das grades

Jornalista egípcio Mohamed Salah fala ao telefone no Cairo após sua libertação da delegacia de polícia no distrito de al-Abassya, em 24 de abril de 2022 [Mohamed El-Raai/AFP via Getty Images]

A cena política egípcia é testemunha de uma clara confusão, que é, aparentemente, demonstrada pelas prisões arbitrárias de jornalistas e ativistas de direitos humanos. Ao mesmo tempo, dezenas foram libertados por indultos presidenciais – uma situação que pode sugerir desacordos entre a soberania e as instituições de segurança do país.

Essa confusão ficou evidente quando as forças de segurança egípcias invadiram a casa do jornalista Hassan Al-Qabani na província de Gizé (oeste da capital) na manhã da última quarta-feira, levando-o a um destino desconhecido, coincidindo com o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa em 3 de maio.

O movimento suspeito coincidiu com o início do diálogo nacional no país, que o regime no poder está promovendo como um roteiro para o que chama de “Nova República”. Este desenvolvimento chocou as comunidades jornalística e de direitos humanos, lançando luz novamente sobre o estado do jornalismo e as restrições impostas à liberdade de expressão no Egito.

Entre as ironias está que a prisão de Al-Qabani, que foi solto no mesmo dia após intervenções sindicais e governamentais, ocorreu após a soltura do jornalista do canal Al Jazeera Mubasher, Hisham Abdel Aziz, que passou quatro anos na prisão, e Raouf Abid, jornalista do jornal ligado ao governo, Rosaelyoussef, após dez meses de detenção.

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Al-Qabani já havia sido preso duas vezes antes; a primeira vez, em janeiro de 2015 e lançada em novembro de 2017; e a segunda vez, em 18 de setembro de 2019, e lançada em 7 de março de 2021. Sua terceira prisão, porém, coincidiu com um dia internacionalmente celebrado pela liberdade de opinião, talvez para enfatizar que o jornalismo se tornou um “crime” no Egito.

Dezenas de detidos

A lista de jornalistas detidos nas prisões egípcias está repleta de dezenas de várias correntes políticas. Alguns deles foram presos duas vezes, enquanto outros ultrapassaram o período máximo de dois anos de detenção pré-julgamento estipulado pela lei egípcia, sem serem encaminhados a julgamento em seus casos principais.

Durante o último ano de 2022, a organização não governamental Associação para a Liberdade de Pensamento e Expressão, com sede no Cairo, documentou a prisão de nada menos que 14 jornalistas.

De acordo com o Arab Media Freedom Monitor (sediado em Istambul), há cerca de 43 jornalistas sindicais e não sindicais detidos em prisões egípcias.

Entre os jornalistas mais destacados detidos em conexão com casos de natureza política estão Mustafa Al-Khatib, Karim Ibrahim, Ahmed Sabia, Hussein Karim e Safaa Al-Korbeigi.

Entre os jornalistas idosos com mais de 60 anos, que podem correr risco de morte por sofrerem de várias doenças, estão Tawfiq Ghanem, (66) ex-diretor do escritório regional da Agência Anadolu no Cairo; o ex-editor-chefe do jornal El Osra El Arabeya, Badr Mohammed Badr (65) e o ex-deputado Mohsen Radi, (66).

A lista de jornalistas detidos que não são membros do sindicato inclui Mohammed Oxygen, Hamdi Al-Zaim (fotojornalista), Ahmed Allam, Mohammed Saeed, Ahmed Abu Zeid, Abdullah Samir, Aliaa Awad e Medhat Ramadan.

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O dilema dos jornalistas que não são filiados ao sindicato se agrava, pois as autoridades de segurança os tratam como se passando por um jornalista. As ações do sindicato em favor deles limitaram-se apenas ao apoio moral.

Jornalistas da Al Jazeera

A situação dos jornalistas da Al Jazeera é considerada uma das questões importantes no Egito, com dificuldades contínuas em ter solução. Um recente avanço é a redução do número de detidos da rede de quatro para dois jornalistas, depois da recente libertação de Hisham Abdel Aziz e de Ahmed Al-Najdi, anteriormente.

A rede do Catar (com sede em Doha) pede a libertação dos dois de seus jornalistas que foram presos enquanto passavam férias com suas famílias. Os jornalistas são Bahaa Ibrahim, detido desde 22 de fevereiro de 2020, e Rabie Al-Sheikh, detido desde agosto de 2021.

Ainda não são conhecidas as razões da intransigência do regime egípcio em não resolver o caso dos jornalistas da Al-Jazeera, apesar de sua aproximação com o Catar, da troca de visitas do mais alto nível, e a contribuição de Doha de um depósito de bilhões e investimentos significativos na economia egípcia.

Em maio passado, o Tribunal Penal de Segurança do Estado Supremo, emitiu  à revelia uma sentença de quinze anos de prisão rigorosa contra o repórter do canal Al-Jazeera Mubasher, Ahmed Taha, sob a acusação de publicação e difusão de notícias e declarações falsas.

‎Além da crise dos jornalistas do canal Al Jazeera, três jornalistas do site Madamasr, que publicaram uma investigação na imprensa sobre o envolvimento de figuras políticas próximas à autoridade em irregularidades financeiras, foram acusados de abusar de membros do Parlamento egípcio afiliados a um partido pró-governo e de fazer uso indevido de meios de comunicação.

As autoridades egípcias bloquearam o site Madamasr no Egito e invadiram seus escritórios no Cairo em 2019. Além disso, sua editora, Lena Attallah, é acusada de criar um site sem autorização.

Na maioria dos casos, os jornalistas detidos no Egito são acusados de publicar e divulgar notícias falsas e abusos.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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