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Com Netanyahu, Ben-Gvir e Smotrich no poder, Israel não precisa de inimigos

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A situação em Israel é sinistra. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu demitiu seu ministro da Defesa, que havia alertado sobre uma possível rebelião das Forças Armadas. Protestos e greves ocorrem diariamente, com bancos, serviços de saúde, sindicatos, aeroportos e portos todos paralisados. O premiê – réu por corrupção – não teve opção senão recuar de sua controversa proposta de reforma judicial.

Em âmbito internacional, a posição de Israel não é nada melhor. Netanyahu se apresenta como mestre da diplomacia e da política externa do Estado sionista, mas seu governo extremista criou atritos e tensões com quase todo o planeta.

O ministro das Finanças de extrema-direita, Bezalel Smotrich, por exemplo, foi ridicularizado em Israel por sua recepção fria nos Estados Unidos e seu inglês terrível. Na França, ele maximizou o dano à imagem e à política externa de seu próprio país, ao discursar de um pódio com um mapa da “Grande Israel” – construto expansionista contendo Jordânia, partes da Síria e do Líbano. Na ocasião, Smotrich foi além, ao insistir que não há história ou cultura palestina e que “não existe essa coisa de povo palestino”. Pouco antes, Smotrich fora condenado internacionalmente por propor que a aldeia árabe de Huwara, na Cisjordânia ocupada, fosse “varrida” do mapa, após colonos ilegais atacarem e saquearem o local.

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A Jordânia, cujo tratado de paz de 1994 consolidou a fronteira comum mais extensa junto ao estado sionista, mostrou particular indignação, enquanto Washington buscava convencer seu regime – junto a outras capitais árabes – a intervir com os palestinos para desescalar a atual onda de violência. O parlamento jordaniano votou unanimemente para romper relações com Israel; a coroa hachemita condenou Smotrich. O infame discurso do ministro não irritou apenas a Jordânia, mas também Arábia Saudita, Síria, Emirados Árabes Unidos, Argélia, Kuwait, Bahrein, Egito, Omã, Irã, Liga Árabe, Organização para a Cooperação Islâmica (OCI), União Europeia e aliados históricos como França e Estados Unidos.

Os americanos têm muitas razões para ficarem furiosos com Netanyahu e seu governo. Apesar dos conselhos e advertências, Tel Aviv fez exatamente o oposto do que solicitou Washington. Políticos e militares dos Estados Unidos visitaram a região e se encontraram com Netanyahu e expressaram seu desagrado com seu gabinete, especialmente com os demagogos de ultradireita Itamar Ben-Gvir e Bezalel Smotrich, ao se recusarem a lidar diretamente com ambos. Netanyahu tentou tranquilizar os americanos ao alegar ter as mãos no volante, mas se contradisse quase imediatamente. Dias após ofertar garantias, o premiê viajou para a Jordânia e se reuniu com o Rei Abdullah. Em casa, tanto Ben-Gvir quanto Smotrich afirmaram em público não ter qualquer compromisso com as promessas de seu chefe ao monarca jordaniano sobre a Mesquita Al-Aqsa e os assentamentos ilegais israelenses.

Há dez dias, uma cúpula regional foi realizada em Sharm El-Sheikh, com intuito de mobilizar a cooperação entre os países e conter a escalada na Cisjordânia ocupada. Representantes de Israel e da Autoridade Palestina (AP) participaram do evento, junto de autoridades dos Estados Unidos, Jordânia e Egito.

Conforme acordo firmado na ocasião, Israel suspenderia seus planos de construção de assentamento por seis meses. Neste entremeio, não obstante, o governo israelense revogou parte da Lei de Desengajamento de 2005, segundo a qual havia retirado colonos da Faixa de Gaza e evacuado quatro assentamentos ilegais no norte da Cisjordânia ocupada. Um porta-voz do Departamento de Estado em Washington descreveu a medida como “particularmente provocativa e contraproducente”, inconsistente com o compromisso de Israel com os Estados Unidos. O secretário de estado adjunto convocou o embaixador israelense em Washington para debater o assunto, movimentação raríssima que dá dimensão ao desagrado da Casa Branca. Netanyahu respondeu ao dizer que a lei era puramente simbólica.

Durante sua visita à Alemanha – um país tão assombrado pela culpa pelo Holocausto que raramente critica Israel –, Netanyahu foi repreendido educadamente pela proposta de reforma judicial. “Como parceiros de valores democráticos e amigos próximos de Israel, acompanhamos este debate muito de perto e – não vou lhe esconder isso – com enorme preocupação”, afirmou o chanceler Olaf Scholz. O incumbente alemão instou seu homólogo israelense a buscar “o consenso social mais amplo possível”, ao enaltecer as promessas do presidente sionista, Isaac Herzog, de desarmar a crise. “Sabemos que o presidente também fez propostas concretas para resolver a difícil situação ontem à noite. Como amigos de Israel, gostaríamos de saber que uma última palavra ainda não foi dita sobre esta proposta”, reiterou Scholz.

Netanyahu, com seu tom próprio, tentou justificar sua controversa reforma judicial: “Israel tem um poder judiciário independente, mas muitos acreditam que é poderoso demais … a acusação de que estamos rompendo com a democracia não é verdadeira”. Contudo, dezenas de milhares de israelenses que protestam cotidianamente nas ruas discordam de seu premiê.

Netanyahu tampouco foi capaz de convencer o presidente americano Joe Biden. “Como muitos fortes apoiadores de Israel, estou muito preocupado”, disse Biden. “Eles não podem continuar por esse caminho”. Questionado se planejava convidar Netanyahu a uma visita à Casa Branca, respondeu Biden: “Não, não a curto prazo”.

Vez após vez, Netanyahu e seus correligionários extremistas parecem determinados a prejudicar as relações entre Israel e seu maior aliado, que envia à ocupação ao menos US$3,8 bilhões em ajuda militar do contribuinte americano a cada ano. “Israel é um país soberano que toma suas decisões pela vontade de seu povo e não com base em pressões do exterior”, tuitou Netanyahu, com particular arrogância, “inclusive de seus melhores amigos”.

Seu ministro Ben-Gvir declarou que Israel não é “outra estrela na bandeira americana”: “Somos uma democracia e espero que o presidente dos Estados Unidos compreenda isso”.

Com pessoas assim no poder, Israel pouco precisa de inimigos externos.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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