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A vida política tem de seguir os passos de união e resistência da Toca dos Leões

Forças israelenses intervêm contra um protesto de palestinos no posto de controle de Havvara, perto de Nablus, na Cisjordânia ocupada, em 21 de outubro de 2022 [Nedal Eshtayah/Agência Anadolu]

Era uma noite de eclipse solar na Palestina, com seis luas no céu de sua terra. Por qual razão, no entanto, as luas deixaram o firmamento? Assim que as luas se põem, voltam a nascer – deveras mais brilhantes.

A Toca dos Leões em Nablus não é um evento passageiro na história da luta nacional palestina, que persevera há mais de um século. Ao contrário, é um caso de redenção, de amor pela terra e paixão profundamente imbuída no coração do povo. A juventude palestina revolucionária, que descartou noções partidaristas em Nablus e saiu à luta unitária contra seus opressores, instituiu uma nova equação que destruiu teorias de segurança de Israel formuladas por supostos peritos de estratégia militar. Tais teorias recorrem sobretudo a propagar a divergência entre os nativos palestinos. A Toca dos Leões – nascida na região de Jabal al-Nar – tornou-se, não obstante, uma verdadeira inspiração e verdadeira lição de resistência e união nacional aos políticos palestinos, que tanto fracassaram nestes quesitos nos últimos 15 anos.

A Toca dos Leões criou união sobre o sangue derramado contra o solo palestino, inseparável das tendências faccionárias repulsivas que exauriram as comunidades árabes e rasgaram seu tecido social. A Toca dos Leões não é composta apenas por jovens de vinte e poucos anos; são homens de coragem, cuja sabedoria equivale àquela dos mais veneráveis anciãos. Os combatentes estão entrelaçados por um forte sentimento de união que políticos veteranos, que alegam sabedoria ou astúcia, fracassaram em demonstrar. Tais políticos falharam uma e outra vez em restaurar a união nacional até que a tragédia dos malogrados acordos de reconciliação se expressou enfim na sociedade palestina.

A juventude de Nablus fez de sua terra uma toca e fez de si mesmos leões – leões, contudo, são sobretudo bons de bote. Leões e leoas não se evadem tampouco barganham, recuam ou aceitam derrota. Leões e leoas lambem suas feridas abertas, mas se mantêm erguidos e orgulhosos em face do inimigo e, sem tardar, retornam à luta. Leões e leoas não se deixam dividir pelo complô das raposas. Por tudo isso, a Toca dos Leões se tornou a nova meca dos revolucionários, onde o sectarismo odiento se dissolveu; portanto, conquistou respeito, amor e bênção dos palestinos. Tamanha experiência criativa da juventude deve ser devidamente acompanhada pela liderança política, há muito dividida e cambaleante.

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A Palestina urge uma dimensão política da Toca dos Leões – isto é, sem qualquer faccionalismo ou sectarismo, com prioridade posta nas demandas nacionais. É essencial que as elites políticas, midiáticas e intelectuais – além de ativistas de longa data – reúnam-se sob uma única bandeira, uma única visão, para formar juntos um reduto político similar ao reduto de resistência armada. O povo palestino decerto acolherá essa iniciativa, em sua diversidade de identidades e crenças. A noção de uma dimensão política da Toca dos Leões será capaz de restaurar o tecido nacional popular, ausente em sua integralidade desde a Primeira Intifada – movimento espontâneo que manifestou coesão das comunidades nativas em sua forma mais elevada.

Deixe-me dizer alto e orgulhosamente: os jovens palestinos superaram seus anciãos. Tamanha revolução moderna na Palestina ocupada teve início com uma geração de jovens que liderou os esforços nacionais quando políticos que viveram a Nakba – catástrofe, quando foi criado Israel, mediante limpeza étnica, em 1948 – fracassaram em fazê-lo, sob promessas de independência e liberdade. Ao contrário, os políticos veteranos permaneceram divididos por sectarismo e ainda insistem em tais vícios duradouros. A juventude tomou a liderança da Primeira Intifada, quando o inimigo pensou ter aniquilado a revolução palestina ao expulsá-la do Líbano. Jovens voltaram ao protagonismo durante a Segunda Intifada, quando o inimigo imaginou equivocadamente ter subjugado a vontade do povo palestino de resistir, após o desastre dos Acordos de Oslo. Jovens palestinos mais uma vez retornam ao centro da arena, na forma da chamada Toca dos Leões de Jabal al-Nar, ao reafirmar que a divisão entre os políticos é uma receita favorável ao projeto de extermínio do estado sionista. Por este motivo, a Toca dos Leões é de maior interesse nacional, ao proteger o sonho palestino de sua catastrófica morte. A Toca dos Leões defende a esperança de gerações e gerações que guardaram em suas gavetas a chave de suas casas, à espera do tão prometido retorno. O mínimo que políticos veteranos podem fazer é acompanhar os passos dos jovens no caminho da união, em respeito ao sangue derramado e às vidas ceifadas.

A nação hoje desperta unida detrás dos mártires da Toca dos Leões, para que jamais regresse à divisão. Que um único sol brilhe sobre nós e dissipe as nuvens do sectarismo, que tanto ofuscou os céus azuis de nossa Palestina.

Este artigo foi publicado originalmente em árabe pela rede Felesteen em 26 de outubro de 2022

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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