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Israel retém palestinos mortos, famílias pedem para sepultá-los com dignidade

Protesto para que famílias de palestinos mortos pela ocupação israelense recebam os corpos de seus entes queridos, na cidade de Hebron (Al-Khalil), Cisjordânia ocupada, 20 de outubro de 2018 [Wisam Hashlamoun/ApaImages]

Há cerca de duas décadas, Mohammad Nassar perdeu seu filho, Shadi, que participava de atividades de resistência contra a ocupação militar israelense, durante a Segunda Intifada. Desde então, Nassar tenta recuperar o corpo de seu filho retido por Tel Aviv.

“Quero enterrá-lo com dignidade, quero descansar em paz sabendo que meu filho está em um túmulo marcado”, declarou Nassar à agência de notícias Anadolu. “Estou com 62 anos e nunca parei de lutar por esse direito, sem parar há quase vinte anos”.

Desde 2008, Nassar é uma figura central na Campanha Nacional para Recuperação dos Corpos dos Mártires, sob a qual parentes de palestinos mortos se mobilizaram para saber a localidade de sepultamento de seus filhos.

“Nossas memórias repousam em cada canto desta casa”, reiterou Nassar. “Seu nome sempre esteve presente em nossas conversas do dia a dia”. Conforme seu relato, cinco de seus netos foram batizados em homenagem ao tio que jamais retornou para a casa.

Mais de cem corpos retidos

Ao menos 102 corpos permanecem em custódia das autoridades da ocupação israelense desde 2015, confirmou o coordenador da campanha, Hussien Shejaeah. Oito são corpos de palestinos que faleceram dentro das cadeias da ocupação. Dez são crianças e três são mulheres.

Documentos do Centro de Direitos Humanos e Assistência Legal de Jerusalém (JALIC) – que lançou a campanha – mostram que há atualmente 265 corpos em cemitérios de indigentes, cujos túmulos são marcados por um sistema numérico em lugar dos nomes.

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“A retenção dos corpos é uma política de punição coletiva com intuito de controlar até mesmo a vida após a morte dos palestinos”, reforçou Shejaeah em entrevista à Anadolu. “É um castigo para famílias que cavam uma cova a seus filhos, na esperança de saber onde visitá-lo nas datas especiais. Uma mãe me disse que se trata de um ferimento perpétuo que não consegue sanar”.

Mohammed Shehadeh, membro do Monitor de Direitos Humanos Euromediterrâneo, observou que as políticas adotadas por Tel Aviv representam violação flagrante das leis internacionais em ao menos três aspectos fundamentais.

A retenção dos corpos infringe a Quarta Convenção de Genebra no que se refere à devolução dos mortos aos parentes. Representa ainda uma medida de punição coletiva – prescrita pelas Regulações de Haia sobre o mesmo documento histórico. Transgrede, enfim, restrições sobre tortura e tratamento desumano ou degradante sob o tratado Internacional de Direitos Civis e Políticos.

Além disso, a política de Tel Aviv de reter corpos palestinos indefinidamente como moeda de troca a eventuais negociações internacionais reflete um doloroso trauma às famílias em luto, que querem apenas se despedir adequadamente de seus entes queridos.

“Negar aos palestinos o direito ao luto é outro exemplo da dimensão do processo de tormento, violência e desumanização imposto por Israel sobre milhões de pessoas sob ocupação”, insistiu Shehadeh.

O ativista destacou ainda que seu movimento reivindica intensivamente das autoridades de Israel a liberação incondicional dos mortos e encaminhou a questão ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas e diversos fóruns internacionais.

“Levamos a questão ao Parlamento Europeu e ao Serviço de Ação Externa, como maneira de pressionar Tel Aviv a dar fim a esta política tão brutal”, observou Shehadeh. “Nosso ativismo persistente em nome desta causa continuará até que todos os 102 corpos sejam libertados”.

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